terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A IMAGEM E SEMELHANÇA





       O ser humano vive buscando o tempo todo a auto-afirmação. Quer sentir que é alguém que ganha destaque no que faz, que marca os passos da vida com escolhas certeiras. E nem sempre isso acontece. Ou acontece com tanta força e sucesso que o indivíduo é reconhecido a vida inteira por isso. E seja no anonimato profundo ou na fama total, um reflexo negativo pode chegar aos filhos.
     Os pais que não obtiveram aquilo que queriam tentam achar isso na sua prole. E às vezes exageram. Eles transferem a responsabilidade de tudo o que não são, não foram e nunca serão para seus descendentes. Uma vez fiz uma reportagem sobre uma seleção de uma agência de moda famosa, que faria um "peneirão" para achar novos talentos para as passarelas e campanhas fotográficas. A fila em um hotel era gigantesca. E com qual espanto, admiração e até bom humor incontrolável eu não me encontrei naquele dia. Vi uma ruma de pais e mães com seus filhos querendo o passaporte para o mundo da fama através da beleza. Mas tinha tanta gente feia que comecei a rir. Se existe um padrão de beleza mais ou menos identificável por qualquer um de nós, definitivamente, a esmagadora maioria ali não fazia parte dele. Tinha rapazes e meninas banguelas, cheios de espinhas, obesos e com os cabelos desgrenhados! E depois da seleção, muito pouca gente sobrou, é claro. E entre aqueles que não alcançaram êxito, era um chororô de dar dó. Mas por quê, minha gente??? O povo não tem espelho em casa não?
     Nelson Piquet tenta fazer com que Nelsinho tenha pelo menos metade do sucesso profissional do Tri-Campeão Mundial de Fórmula 1. E na verdade o que mais marcou a carreira do menino até hoje foi um escândalo em que o filho participou de um esquema para alterar o resultado de uma corrida. Já o Tetra-Campeão Mundial de Futebol, Romário, tem no primogênito de mesmo nome uma esperança e expectativa de craque. E enquanto Neymar já era sucesso no planeta inteiro aos 17 anos, Romarinho, um ano mais velho, ainda disputa competições sem grande expressão e não parece ter um caminho semelhante ao do pai. E se a genética determinasse os talentos, Edinho, filho de Pelé, não teria sido goleiro. E estaria com o nome gravado na história do futebol, assim como o Rei. Mas não é assim que funciona.
      Longe das celebridades, também vejo os genitores diligentes no seu desejo de fazer com que os filhos imitem ou sejam o que eles nunca conseguiram. Nas famílias tradicionais no Direito, na Medicina ou no Comércio, por exemplo, é quase regra dar continuidade ao que os pais fazem, até por uma questão de manter o destacável status. E como determinados talentos não nos chegam por descendência direta ou osmose, nem sempre o sucesso se repete e as pessoas ficam tolhidas nas suas vontades e reais inclinações, nas quais seriam mais felizes. E tem direito de serem diferentes! Mas o pior é a cobrança implacável. Uma "falha" significa que você não é alguém que engrandece seus pais e sua família. Quer dizer que você passou em branco no quesito "dar orgulho". 
      Para muita gente, não existe a liberdade de ser quem se é. E vemos pessoas infelizes, profissionais frustrados que protagonizam imperícias, negligências ou vítimas de depressão. Isso porque ninguém aguenta ser quem nunca vai ser. Ainda mais para agradar a um desejo reprimido de alguém que não está dentro de você e nunca vai estar.

2 comentários:

  1. É bem verdade isso que vc afirmou. Meu pai e minha mãe mesmo pensavam que eu iria ser médica ou engenheira, mas a minha sorte é que nunca me cobraram fazer isso. Escolhi aquilo que eu gosto: Letras e Jornalismo, e faço os dois com paixão! Não me importo com o que a sociedade pensa de mim, o que importa é como eu faço, meu caráter.
    A sociedade impõe muitos valores e padrões que ninguém sabe a origem deles...é arbitrário...então pq cobram?
    Muita gente se importa tanto com sua aparência para a sociedade que já não sabe quem é ele(a) mesmo. É como o autor Stuart Hall disse, a sociedade está perdendo sua identidade e não é só com a pós-modernidade, mas desde o passado.

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  2. Temos de refletir, inclusive fazendo uma auto-análise. Se já sentimos isso na pele, temos de ter coerência para não repetir com os nossos filhos.

    Como sempre, texto bem elaborado, Jornalista Plínio Almeida. Parabéns.

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